terça-feira, 19 de abril de 2011

Aparelhagens recebem veto ao título de patrimônio

Sempre polêmico, o tecnomelody mais uma vez anda causando barulho. E sim, é por causa das suas potentes aparelhagens. Enquanto o ritmo que mistura batidas eletrônicas e brega se torna cada vez mais popular e começa a fazer carreira para além das fronteiras do Estado e até mesmo do Brasil, por aqui, fervilha a discussão do valor desse estilo musical e do seu maquinário tecnológico como marcas da identidade cultural paraense.
Isso porque, no último dia 15 foi vetado pelo governo estadual o projeto de lei que pretendia tornar o tecnomelody e as aparelhagens patrimônios cultural e artístico do Pará. A decisão veio depois do projeto ter sido aprovado por unanimidade na Assembléia Legislativa do Estado do Pará (Alepa). Com o banho de água fria, DJs e bregueiros prometem lutar para reverter o veto.
Para esclarecer: a ideia de promover o ritmo ao título de patrimônio cultural - iniciativa do deputado estadual Carlos Bordalo (PT) -, seguia promissora, e foi aprovada sem qualquer oposição no último mês de março na Alepa. Mas eis que a inclusão das aparelhagens também como patrimônio causou a discórdia entre deputados e a assessoria jurídica do governador Simão Janete. Segundo nota publicada no Diário Oficial, mesmo admitindo a relevância à proteção ao tecnobrega como ritmo musical exclusivo do Pará, o governador alegou que “o mesmo não se pode afirmar quanto às aparelhagens de som e seus símbolos, os quais não passam de meio material da divulgação do ritmo em questão, que não detém significação cultural ou artística, mas meramente técnica (sem qualquer inovação tecnológica) e comercial (os símbolos, marcas de propaganda)”.

REPERCUSSÃO
“Achar que as aparelhagens são meramente uma máquina de som é até ignorância. As aparelhagens já existem há mais de 60 anos nas festas paraenses. São um símbolo cultural, integram o movimento do tecnomelody que, aliás, sempre foi marginalizado, porque nunca recebeu nenhuma benesse do governo, nunca foi acolhido. Ele existe por muita competência de organização independente, e por isso está fortalecido no mercado”, diz Manoel Machado Júnior, presidente da Associação dos Proprietários de Aparelhagens Sonoras do Estado do Pará, Apasepa, que reúne as mais populares: Rubi, Tupinambá, Príncipe Negro e Superpop.

Ainda segundo o texto do Diário Oficial, Jatene argumenta que, ao pretender tornar as aparelhagens como patrimônio cultural, o projeto de lei transgride a Constituição.
“Assim, como o cerne da lei aprovada é um só artigo (o 1º), onde se constitui a proteção artística cultural para o ritmo (até esse ponto constitucional), se a redação dele fosse até aí, não estaria contaminado pela inconstitucionalidade. Mas, ao estendê-la para o meio sonoro e marcas de divulgação do ritmo, foge do conceito destinado à proteção cultural e artística imaterial. Então, acaba por torná-la inconstitucional em seu todo”, conclui o governador em seu pronunciamento.
Edilson Santos, dono de uma das maiores aparelhagens do Pará, o Príncipe Negro, critica o ponto de vista do governo. “Você consegue ver o tecnomelody sem aparelhagem? Não existe isso. A aparelhagem é como se fosse o trio elétrico da Bahia, só que fixo. Se lá o trio é patrimônio do estado, porque aqui as aparelhagens não podem ser?”, argumenta DJ Edilson, que há 22 anos toca nas picapes.

O momento é de contra-ataque. Pelo menos é o que planejam os artistas ligados ao tecnomelody. “Estamos revoltados. A primeira iniciativa é procurar apoio dos deputados e buscar uma solução. A situação é lamentável. Eu espero que o veto não tenha sido por questões de ordem política, já que o deputado que propôs a lei é de oposição ao governo”, diz Manoel Machado.
Bordalo explica que os argumentos do governador estão sendo analisados, e que o veto não representa uma decisão definitiva para o futuro do projeto de lei.
“Já que se estabeleceu um conflito entre a Comissão de Constituição e Justiça da Alepa e a Assessoria Jurídica do Governador, o documento volta para a Câmara para que sejam apreciadas as argumentações de veto. E eu acredito completamente que não teremos que mudar nada no projeto, porque não há nada nele de inconstitucional. Vou defender a derrubada do veto”.

Brasil está de olho no ritmo
Enquanto a polêmica toma corpo na Câmara, fora dela também não faltam opiniões. O músico Felipe Cordeiro, que ganha projeção nacional com seu novo disco, que transita por vários elementos do brega, considera o projeto um tanto oportunista. “Me parece um pouco inadequado. Há outras manifestações populares à frente nessa causa, como o carimbó, principalmente. Há uma certa dose de oportunismo pelo momento do tecnobrega. O brega, sim, é uma das marcas mais fortes daqui. Mas o tecnobrega é recente, é uma manifestação urbana, que de certa forma tem a proteção de grupos de mercado”, argumenta o artista, filho de Manoel Cordeiro, nome de vanguarda da lambada paraense.
Para Bordalo, é hora de brigar pela aprovação do projeto. “Recentemente, a banda Deja Vu tentou patentear o tecnomelody como ritmo baiano. Precisamos defender o que é nosso”, diz.
Mais do que o apelo cultural, há quem destaque a imponência econômica do estilo musical. “No Sul e Sudeste, há muitas pesquisas que investigam as raízes do tecnomelody, o que ele representa como cadeia produtiva. Ou seja, o Brasil todo está interessado nisso. Inclusive ele foi apontado como uma das maiores oportunidades de negócio aberto de toda a América do Sul”, diz o presidente da Apasepa, Manoel Machado, referindo-se ao livro “Tecnobrega: o Pará reinventando o negócio da música”, publicado em 2008 pela Fundação Getúlio Vargas. 

Fonte: www.diarioonline.com.br 

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