O primeiro porto de Belém era denominado de porto da Praia e localizava-se à margem esquerda do igarapé do Piri, que desaguava na baía do Guajará, onde hoje fica a doca do Ver-o-Peso. No processo de povoamento da cidade são configurados dois núcleos de ocupação, separados pelo braço deste igarapé: o bairro da “Cidade”, que ficava junto da Praça Matriz e do fortim do Presépio e o bairro da “Campina”, na parte sul, constituído a partir da abertura da Rua dos Mercadores (atual Conselheiro João Alfredo). Esta via aberta passa a atrair grande parte dos comerciantes locais, transferindo o desembocadouro principal da margem esquerda para a margem direita do igarapé. Por centenas de anos este foi o principal acesso por onde partiam e chegavam mercadorias, pessoas, informações e ideologias na região amazônica.
Ao final do século XIX, o porto de Belém aparece como o terceiro mais movimentado do Brasil, ficando atrás apenas dos de Santos e Rio de Janeiro. O aumento das exportações da borracha, o “ouro negro” amazônico, e o crescimento da afluência de embarcações tornavam necessária a reorganização do núcleo portuário da cidade. Após a elaboração de diversos projetos de reforma do cais, o governo federal concede em 18 de abril de 1906 ao empresário norte-americano Percival Farquhar, a iniciativa de realizar as obras de modernização do porto de Belém e no dia 7 de setembro do mesmo ano, Farquhar funda a Companhia Port of Pará, que será responsável pela administração do porto da cidade.
As obras têm início no ano de 1907. Durante os próximos sete anos é realizado um gigantesco projeto de intervenção urbana como a cidade jamais havia visto, mobilizando milhares de braços e a mais avançada tecnologia internacional. As obras aterraram parte da região dos antigos trapiches e realizaram a dragagem de um canal de 3.300 m de largura em toda a extensão do cais. A empresa também efetivou a instalação de linhas férreas de iluminação, construiu edifícios para a administração, construiu armazéns para o depósito de mercadorias e abriu uma rua paralela ao cais, a Av. Marechal Hermes.
Embora enfrentando problemas, como a grave epidemia de febre amarela que contaminou inúmeros trabalhadores, e as diversas ações judiciais de empresas que protestavam contra o encurralamento de seus trapiches pelas obras de construção, no dia 2 de outubro de 1909, é inaugurada a primeira seção do novo cais de Belém.
Incrustado no entorno do centro histórico da cidade, embora ainda impressione por sua monumentalidade, o porto de Belém é um patrimônio centenário quase invisível pela população que desconhece sua importância como espaço simbólico de constituição da sociabilidade de identidade local. Em meio a atuais polêmicas sobre a diversificação dos usos do espaço portuário e a desmontagem de galpões para a ampliação do pátio de contêineres, os projetos que visam interferências no complexo portuário vêm continuamente se esquecendo de inserir um elemento essencial para a preservação e valorização desse patrimônio: a sociedade belenense.
As imagens publicadas são do livro Porto de Belém: primeiro centenário, de autoria de Luciana Furtado e fotografias de Rodolfo Braga.
TEXTO: LUCIANA FURTADO
Luciana Furtado é historiadora pela Universidade Federal do Pará, especialista em Patrimônio Cultural e Educação Patrimonial, professora da rede estadual de ensino e vice-presidente da Associação de Agentes do Patrimônio da Amazônia - ASAPAM.
IMAGENS: RODOLFO BRAGA
Rodolfo Braga possui graduação em Geografia (Bach/ Licenc) pela Universidade Federal do Pará (2007), com exercício de pesquisa na área de História, com ênfase em Patrimônio, Memória e Imagem. Atualmente presta serviços relacionados à fotografia e a pesquisa e reprodução de documentos, pinturas, fotografia, gravuras e outras.
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